terça-feira, fevereiro 22, 2005

História de um Incorrigível

A história que vou partilhar com vocês teve lugar num dos mais antigos e prestigiados Liceus de Lisboa. A escola tinha uma professora de Fisico-Química já bastante velha (para não dizer decrépita), que queria despachar para dar lugar a outra mais nova e com melhor feitio. Apesar dos esforços não conseguiu, pelo que se decidiu por enviar a senhora para um curso de actualização pedagógica, durante os meses de verão. No dito curso a professora foi actualizada compulsivamente em relação a todos os estatutos especiais, possíveis e imaginários, como por exemplo, o de aluno disléxico, o de aluno com dificuldades de aprendizagem, o de atleta de alta competição etc. Aprendeu também que berrar como uma ave canora nem sempre é a melhor maneira de controlar uma turma e que tratar os alunos como uns débeis mentais também não é a melhor estratégia para os ensinar. O ano começou e a professora apresentou-se aos seus novos alunos com novos métodos e novos modos, ponderada, sensata, educada, tolerante e respeitadora, na esperança de fazer a direcção mudar de ideias. Logo no primeiro dia teve a oportunidade de aplicar os seus novos conhecimentos, um aluno da sua turma disse-lhe que tinha dificuldades de aprendizagem e apresentou-lhe um relatório comprovativo. Diligentemente, a professora apressou-se a marcar-lhe uma hora de dúvidas e a prometer-lhe todo o apoio de que precisasse para a disciplina. O que ela não sabia era que única dificuldade que este aluno tinha era a de não arranjar confusão com professores. A notícia de que a professora tinha ido para um curso de actualização tinha corrido pela escola e ele tinha decidido aproveitar o pretexto. Ao longo da primeira metade do primeiro período, o “Pedro” agiu de acordo com o seu “estatuto”, compareceu a todas as aulas de dúvidas e esforçou-se por não perceber 2/3 da matéria. Durante as aulas mostrava-se inseguro e colocava as dúvidas mais estapafúrdidas de que se lembrava. A professora, embora com dificuldade, esforçava-se por manter a sua nova postura. A situação foi-se arrastando até ao primeiro teste, altura em que o “Pedro” resolveu fazer o que realmente sabia. Escusado será dizer que a professora, quando corrigiu o teste do “Pedro”, quase teve um ataque. Viu-o e reviu-o dezenas de vezes...e para seu espanto o aluno que tão grandes dificuldades manifestava nas aulas tinha tido 19,2. Colocou várias cenários, de entre os quais o recurso a cábulas, ter-lhe roubado o teste ou ter copiado por alguém. Atormentada com este dilema, resolveu falar com a directora de turma para deslindar este mistério. Não a consegiu encontrar, pelo que teve de adiar a conversa para a reunião intercalar. Deixou passar o resto da semana e na reunião confrontou a directora de turma com a situação. Esta ficou perplexa ao ouvir falar de um aluno com dificuldades de aprendizagem. Perguntou-lhe o nome desse aluno e recebeu a resposta com incredulidade. O mesmo aconteceu com os restantes presentes. O “Pedro” era um dos melhores alunos da turma e ninguém percebia como é que ele poderia ter o estatuto de aluno com dificuldades de aprendizagem. Se acham que sabem como esta história termina, estão enganados. A professora teve um ataque em plena reunião e atirou tudo o que tinha à mão ao ar, pastas, canetas, papéis, agrafadores, furadores, tubos de cola, tesouras e chaves. A sua fúria prolongou-se até ao corredor, onde destruiu um aquecedor e atirou um tapete pela janela. O “Pedro”, recebeu três dias de suspensão e foi obrigado a redigir um pedido de desculpa que nunca ninguém chegou a ler. A professora acabou por concluir que estava na altura de ser reformar e despediu-se a meio do ano. A sua primeira substituta deu aulas durante uma semana e teve de ser substituída por outra, uma vez que foi atropelada por uma Ford Transit.